Há cerca de três semanas foi publicado no Youtube do um vídeo em que o comediante Afonso Padilha (2,8 milhões de inscritos) interage com uma mulher de 66 anos, presente na plateia.
Comum nesse tipo de apresencação, a troca com o público costuma ser aproveitada como oportunidade de improvisos que façam o público rir. No episódio em questão, a mulher conta a Padilha que, após ter ficado viúva, entrara no Tinder.
A informação em si rendeu gargalhadas à plateia, e Padilha – como já ocorreu em outras apresentações – desembestou a soltar falas que ridicularizam pessoas mais velhas e reforçam o etarismo. Seu público é predominantemente jovem, abaixo dos 30 anos, incluindo crianças e adolescentes.
Esse vídeo apenas me lembrou quando, há pouquíssimo tempo, duas ou três décadas, piadas ou ironias a respeito de grupos considerados minorias eram propagadas sem nenhum tipo de questionamento. Quem cresceu nos anos 1980 e assistiu a programas humorísticos daquela época sabe do que estou falando.
Se hoje, em 2023, finalmente falamos abertamente sobre machismo, racismo, capacitismo, intolerância religiosa e homofobia, entre tantos outros temas, é porque essas pessoas lutaram e ainda lutam por respeito. O primeiro passo da luta, o mais simples, é o de dar nome às coisas.
O que Afonso Padilha praticou, por 20 minutos, chama-se etarismo.
Interessante pensar sobre o que é considerado “engraçado” em uma determinada época revela sobre os valores vigentes. A julgar pelo êxtase do público diante de falas que ridicularizam pessoas maduras, ficou claro que há muito chão pela frente no que eu chamo de “cultura de longenvidade”.
Aqui, 11 frases ditas pelo comediante:
- “A senhora está no Tinder mesmo? Pode essa faixa etária assim, dos 18 à Palmirinha?”
- “O que você colocou de interesse no Tinder? Sopa, bingo?”
- “Por que velho tira foto na frente do carro?”
- “A mesma possibilidade de ter velho na frente do carro é velha na frente de planta.”
- “Quando você está no Tinder com uma pessoa acima de 60 anos, você pede pra ela mandar uma foto de agora. Pode ser que daqui a pouco ela já não esteja viva”.
- “O cara tem 68 anos, solteiro e sem filhos? Fica longe que é psicopata.”
- “E esse cara deitado na rede, muito confiante, de short com os ovão de fora – como todo velho?”
- “É engraçado como velho não gosta de usar pontuação.”
- “A senhora faz exercício? Esticar velho não vale.”
- “Só não tem troca de fotos porque (velha) não sabe enviar.”
- “A senhora só c$up@u um pau na vida?”
Mariana Mello é jornalista e idealizadora do Maturidades, iniciativa independente da Alma Content voltada à cultura de longevidade. Tem 42 anos e fala sobre envelhecimento sem noias. Está com o ácido hialurônico e o filtro solar em dia. Já o colágeno, nem tanto.
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