Um dos trabalhos que realizamos aqui na Mature Future é analisar a abordagem do assunto longevidade/envelhecimento na comunicação – jornais, propagandas, redes sociais. Se pensarmos que uma cultura é construída também por narrativas, e que as narrativas se dão por meio de palavras, nós que somos profissionais da área podemos e devemos puxar essa conversa.
Não vou falar hoje sobre a polêmica do diminutivo – velhinha, vovozinha – nem mesmo do termo nu e cru, como ele é, “velho”, porque só esse assunto merece um texto único. O que me chamou a atenção aqui, no jornalismo, foi o emprego da palavra “idoso” em um título.
Olhando assim, sem pensar muito, não parece um problema. Afinal, idoso é qualquer pessoa acima de 60 anos (isso no Brasil) – e o homem citado na reportagem tem 68. Errado não está. Porém, do jeito como o título se apresenta, podemos chegar à conclusão de que o crime descrito na reportagem ocorreu pelo fato da vítima ser idosa. Pela nossa cultura atual, estamos acostumados a reproduzir ideias como “idosos não dominam tecnologia” e mais uma porção de estereótipos.
Há idosos que se perdem na tecnologia. Mas não são todos. Muito menos isso é uma regra. Há pessoas mais velhas atentíssimas aos riscos dos crimes digitais e versadas o suficiente nas novas tecnologias. Da mesma forma como há também pessoas não-idosas, com os mais variados perfis, que caem nos mesmos golpes. Não é uma relação ligada à idade, como o senso comum costuma reproduzir.
Como eu faria esse título: “Homem marca encontro por aplicativo e vira refém.” Simples assim. E, na matéria, escreveria Fulano de Tal, 68 anos. Tal qual os bons manuais de redação jornalística. Soa diferente para você? É sutil. Como dizia um ex-chefe meu, Deus está nos detalhes.
A quebra de paradigma ligada à idade está só começando. Preconceito etário sempre existiu, a diferença é que não tinha internet E não tinha gente madura/empoderada – e com dinheiro – usando redes sociais, filmando, fotografando, se expressando. Muito menos essas pessoas eram maioria da população no Brasil, como deve acontecer até 2030.
Eu, por exemplo, sou quarentona (seja lá o que isso queira dizer). Mas prefiro que você me veja como uma mulher, jornalista, palestrante e, a título de curiosidade, uma pessoa de 42 anos. Diferente da matemática, no ofício da escrita a ordem dos fatores altera, e muito, o produto.